Persépolis



Uma garota que cresce entre as turbulências políticas do seu país, a mundialização da cultura e as características experiências da adolescência e da juventude nas sociedades contemporâneas. Marji é a protagonista dessa animação realizada na França, mas sobre os anos de despertar de uma jovem iraniana reflexiva sobre sua vida e a história do seu tempo.   

Em Persépolis, Marjani Satrapi divide o roteiro e a direção do filme onde narra sua própria trajetória pessoal enquanto o Irã também se transforma. Persépolis no cinema é, por sua vez, uma versão da primeira visualidade realizada por Marjani para a sua autobiografia, a HQ com o mesmo título, publicada em quatro volumes entre os anos de 2000 e 2003.

Contar a vida através de imagens é uma trama pictórica para a memória. Existe a restituição desenhada do passado através de formas e cores impressas no pensamento. E existe também sua expressão novamente desenhada para ser projetada em uma mídia. E assim, imagens que serão emaranhadas ainda com as visões daqueles que assistem essa criação.  

Ao atribuir o nome “Persépolis” para contar sua juventude, Marjani amplifica sua própria identidade. Acompanhar a garota iraniana diante das dificuldades, os embaraços e as incertezas que vive é ver abrir um cenário para uma história que nos atinge também. O Irã das reiteradas imagens exóticas adquire aqui traços comuns para qualquer garota do planeta.

Uma força presente na narrativa de Marjani é a capacidade de presentificar, através dessa trama de imagens, uma sociedade mais ambígua do que aquela que estamos acostumados a imaginar quando apenas fixamos nosso olhar no véu que parece tudo esconder. O preto e branco do filme é mais nítido que o noticiário da TV sobre a sociedade distante dos “persas”.

A garota – personagem e autora – conta sua vida enquanto entramos em uma história que é de todos nós, a história do nosso tempo. É apenas o seu ponto de vista, claro. Mas vasto, por isso tão atraente para esse filme de animação, vívido documento de uma época e tocante poesia sobre a feminina juventude em um mundo que se transforma velozmente.

Marjani é ainda uma criança quando assiste a Revolução Iraniana (1979). Em razão das suas implicações políticas, a família vê com expectativa o desenrolar dos acontecimentos. A instauração de uma República Islâmica frustra pelas esperanças democráticas não realizadas e pela situação asfixiante da política em uma sociedade agora dominada pelos religiosos. 




É nesse clima que Marjani irá crescer. Apesar da vida cotidiana represada, constrangida pelo hábito religioso imposto, o contato com o “mundano” proporcionará o cultivo de gostos de uma cultura pop internacional – a banda Iron Maiden, por exemplo – que mobilizam seu temperamento crítico e inconformado.

A narrativa tem momentos tocantes, como a vida familiar entre parentes idealistas, que formam seu caráter. Também comovem muitas cenas de uma sociedade saturada de conflitos, como a guerra com o Iraque. A morte em um filme de animação poderia sugerir menos realismo, mas através de outros traçados imagéticos também tece a nossa subjetividade.  




Para uma história radicada em uma memória autobiográfica enredada nos episódios políticos recentes de um país, Persépolis nos oferece uma linguagem com capacidades singulares. Sem os “efeitos especiais” do cinema “comum”, mas com os elementos recorrentes da arte do cinema de animação, Persepólis exprime as fantasias da sua protagonista como uma rotina da vida.

Na verdade, o imaginário e o extraordinário fazem parte da história humana, dos seus personagens míticos ou das pessoas comuns. O cinema de animação muitas vezes é a exibição desse amálgama do factual com o mágico, onde “realmente” existimos e também idealizamos outras vidas. Marjani mostra em sua história que é uma pessoa e um desenho – como todos nós somos também.   


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Título Original: Persepolis
Direção: Marjani Satrapi e Vincent Paronnaud
País: França
Ano: 2007
Classificação indicativa: 12 anos




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