O Professor Substituto
Recentemente, filmes franceses sobre professores não faltam para
assistir por aqui, enriquecendo nossas redes de conhecimentos sobre o
magistério hoje. Pena que são exibidos, no entanto, em uma rede muito pequena
de cinemas. Agora foi a vez de conferir O Professor Substituto, de Sébastien Marnier. Os outros
dois que assisti, desde o final de 2017, são: O Melhor Professor da Minha Vida e O Orgulho. No Rio de
Janeiro, assisti todos no bairro de Botafogo, na zona sul. São filmes que
chegam por ali e não cruzam muitas fronteiras. Nas periferias, os filmes são
sempre os mesmos, exibidos em qualquer Shopping Center.
Com o cinema pensamos a realidade do magistério também, seus
problemas e desafios na contemporaneidade. Inclusive, com filmes que trazem,
entre seus personagens, professores e alunos. O cinema, como uma produção
artística que interpela o nosso tempo, encontra nos “filmes de escola” um
contexto bastante significativo para essa expressão crítica. Portanto, como
educadores, bem que poderíamos aproveitar mais essas produções nas licenciaturas
e na graduação de pedagogos. Por que, afinal, não acreditamos mais no valor do
cinema na formação de professores?
O Professor Substituto é um filme relevante e perturbador. Ser pertinente geralmente
assusta. Está aí o cinema para nos colocar diante do que preferimos não ver. O
Professor Substituto começa com um suicídio. Diante da turma, um professor
se joga pela janela da classe. Um mistério: o que teria motivado tal ato? E
vamos continuar indagando sobre o que se passa durante todo o filme. O que meus
olhos preferem deixar escapar? Com uma
narrativa de suspense, O Professor Substituto nos mantém curiosos. Face a
sociedade da transparência, lisa, o suspense nos prepara para o incômodo que
virá, disforme.
Pierrre
(Laurent Lafitte) irá substituir o professor do trágico acontecimento. Ele será
informado pelo diretor, Poncin (Pascal Greggory), sobre a turma do obscuro
incidente. A turma é um experimento.
Nela estão reunidos os alunos excepcionais do 9º ano, garotos e garotas com
notas superiores. Pierre comenta que está acostumado com turmas com jovens com
dificuldades juntos, mas não com alunos de elevadas capacidades reunidos. A
recepção não é boa. Imediatamente a turma terá uma atitude conflitante com o
novo professor, afastando sua presença. Incomodado, começa a prestar atenção nesses
jovens.
Separados
dos demais alunos pela proeminente inteligência, terminam formando algo que
parece uma irmandade encapsulada, que repulsa o contato. Provocado pelo
estranho comportamento da turma, Pierre resolve acompanhar, incógnito, um grupo
de alunos. O que fazem, seus encontros e suas recreações. As descobertas são desconcertantes. As
brincadeiras envolvem perigo, desafios em que são machucados e arriscam a vida,
sempre filmado por alguém do grupo. No local dos encontros do grupo, Pierre
encontra uma pequena coleção de DVDs e leva para casa um deles para assistir o
conteúdo.
Outros
acontecimentos estranhos cercam Pierre depois que começou a lecionar na escola.
Recebe telefonemas de alguém que não se identifica e permanece muda. Pierre tem
pesadelos, acordando sobressaltado. Pierre está transtornado. O que teria
levado o professor que o antecedeu na escola ao suicídio? No DVD, além dos
vídeos gravados, nos quais aparecem infligindo sofrimento entre eles,
procurando o limite de cada situação, destacam-se várias imagens que mostram a
destruição provocada pela atividade humana no planeta e a ausência absoluta da
compaixão na sociedade industrial.
Uma
trama se desenvolve com o grupo que tenta recuperar o DVD que foi subtraído
pelo professor, enquanto o encerramento das aulas e a formatura se aproxima. Aí
já é possível compreender bastante o que se passa, embora a proximidade do
final do filme ainda contenha situações que prendem a nossa atenção até à
enigmática cena que encerra tudo. Tudo mesmo. Saí do cinema bastante pensativo
sobre o que vi ali, pensando: O que nos dizem os jovens sobre os planos que
nós, adultos, dirigimos a eles agora, nas sociedades que estamos construindo? O
que relutamos enxergar e o cinema nos mostra?
Costumo
dizer que os jovens são os esquecidos da pedagogia. O Professor
Substituto resolveu
lembrar. O que pretendemos com a formação das juventudes? Tudo parece
organizado pela escola para a passagem dos jovens por ela. No final, terão
feito o melhor, é a propaganda. Estarão preparados, mas para quê? Os jovens
sabem muito bem o que é preparado para eles. Esse é o maior incomodo do filme: deixar
ver o que significa o êxito escolar quando estamos inviabilizando tudo o que
virá depois. Os jovens desencantam nossas ilusões. Eles não caem mais na
história de que a educação escolar segura uma vida inteira.
O
dispositivo narrativo que deixa nossos olhos bem abertos no filme foi a
condensação do mal-estar dos jovens em uma turma de alta habilidades. Aquilo
que enxergamos de forma bastante relutante e lateral, aqueles jovens, juntos,
não deixam escapar à nossa visão.
Duas
questões ainda para finalizar meus pensamentos sobre o filme.
Por que um professor substituto. Aliás, o grupo debocha dele por isso. O “substituto” é alguém de fora, alguém em condições de um olhar penetrante. O que ele viu, seus colegas mais antigos na escola não tinham mais a capacidade de sentir incômodo legítimo. Deparar-se com a realidade, às vezes, sobra a morte.
Outra coisa. Pierre é gay. É possível saber durante o filme. O que significa para a narrativa? Nada? Arrisco uma resposta. O olhar heteronormativo cega.
O filme ainda está em cartaz na cidade, pelo menos até o dia 14 próximo, em duas sessões no Estação NET Rio. Acho que vale a pena conferir.
Os fotogramas foram extraídos do trailer.
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Título: O Professor Substituto
Título Original: L’Heure
de la Sortie
Direção: Sébastien Marnier
País: França
Ano: 2018
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